quarta-feira, 12 de maio de 2010

Se "o povo" fosse um ente, teria uma longa lista de crimes nas costas

Na política, nas ciências, nas artes, no pensamento, a voz do povo não é a voz de Deus. Ao contrário até: o capeta costuma ser mais íntimo do alarido das ruas do que o Altíssimo. Os grandes horrores da história foram perpetrados quase sempre sob o calor enfurecido da turba ou sob seu silêncio frio e cúmplice. Se "o povo" fosse um ente, teria uma longa lista de crimes nas costas. Mas não é. A democracia representativa é uma grande invenção porque os lugares de mediação das demandas — o Legislativo, o Judiciário e o Executivo — geram eles próprios um novo saber, que é diferente do saber das ruas. Se as massas querem, para citar um exemplo, justiça imediata — de que o linchamento é expressão máxima —, o Poder instituído tem de dizer "não" porque esse imediatismo traz consigo o risco de degeneração do sistema e incentiva um voluntarismo que exclui o direito de defesa. E o direito de defesa, mais do que a punição imediata, resguarda a vontade coletiva; nesse caso, tirá-lo daquele que foi condenado sem processo corresponde a tirá-lo de todos os indivíduos desde que a maioria assim o decida.

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